quarta-feira, 6 de julho de 2011

Retorno



GRAVURA: CONSIDERAÇÕES PESSOAIS

Considero a gravura como uma poderosa linguagem artística, capaz de permitir ao artista infinitas possibilidades de criação. Quando ingressei no IFCE, em 2007, ainda curso tecnológico, optei pela disciplina de gravura como a de minha preferência, apesar do horário compatível com minhas atividades profissionais consegui aos trancos e barrancos manter-me. Hoje não me arrependo, pois o que aprendi foi importantíssimo para meu desenvolvimento artístico.
A gravura me abriu ainda um vasto campo de investigação pedagógica e de comunicação que muito me auxiliarão em minhas atividades no magistério.
Não vejo ainda com clareza, o rumo que pretendo seguir em minha carreira artística, prefiro antes digerir todos os ensinamentos que estou recebendo e deixar que o tempo se encarregue de me apontar um caminho. O que tenho como certeza em relação à gravura é que é apaixonante. Seria de se supor que a tecnologia viesse a tornar a gravura algo sem sentido no mundo atual. No entanto, ela permanece como um encantador meio de comunicação e expressão para o qual não existe substituição.

É claro que os parques gráficos não necessitam mais de uma matriz seja em madeira ou em metal para se reproduzir imagens e ilustrações. E é justamente por isso, talvez, que a gravura, por exemplo, esteja livre de determinada técnica e desligada da lógica de produção de mercado. Desvinculada da sua função ilustrativa, a xilogravura ganhou espaço como arte plástica independente e autônoma, ela possui seu próprio código, e esse código não possui limites: tabula rasa para infinitas experimentações.
Assim é que no Nordeste do Brasil, os xilógrafos que surgiram graças à demanda das pequenas gráficas de literatura de cordel, logo se puseram a executar trabalhos independentes como álbuns e séries de inestimável valor. Estas gravuras realizadas longe dos moldes da capa de cordel formam o palco de revelações do poder criativo desses gravadores, que quase sempre são autênticos representantes do povo, motivo pelo qual, a xilogravura no Nordeste do Brasil ficou marcada pelo caráter popular de uma técnica artística.
Meu trabalho tem características dessa xilogravura popular, deliciosamente rústica, cujo desenvolvimento se dá em nosso curso, acadêmico sim, mas sem desprezar a engenhosidade técnica de seus gravadores. Aprendi, por exemplo, a disciplina do trabalho artístico, no desenho, na composição, no uso dos materiais, enfim, em gravura nada é deixado ao acaso, tudo precisa ser criteriosamente planejado, seja uma matriz de madeira, para xilogravura, ou um arquivo digital para impressão, a gramatura do papel de impressão, tudo precisa ser controlado, avaliado, do primeiro traço depositado na matriz ao gesto final de retirar o papel da prensa com o resultado do trabalho, tudo passa pela mente do artista, tudo é pesado, questionado, e só então passasse à execução propriamente dita.
Outra vantagem da gravura, além do método disciplinador de trabalho que ela incute no artista ao passar por várias etapas de transformação da ideia até chegar à reprodução, é que ela permite ainda, através da matriz, uma recuperação constante do que foi feito. Com a matriz à mão, pode o artista fazer leituras constantes de sua experiência, desenvolver ou recuperar coisas que ficaram para trás.
Tudo isso faz da gravura uma Arte maior. Parece que no ato de arranhar, escavar, corroer, entintar, prensar, manipular o material de todos os modos, num envolvimento total, o artista está de fato burilando sua personalidade. É gratificante poder retirar o papel da prensa, num gesto final, e poder constatar que todo o esforço e suor deram resultado e a imagem aparece ali no papel, nas cores e formas que você imaginou. É frustrante também quando se percebe que houve falhas ou que nada deu certo, mas isso não desanima, até estimula mais, pois o erro ficou registrado, ou na matriz ou em alguma das etapas; e o artista arregaça as mangas e parte para a reabilitação do trabalho e o aprendizado continua. Na gravura, até o erro tem valor significativo.
A gravura me fez ainda compreender que a linguagem da arte não é só reproduzir um objeto ou ser. O traço tem qualidade expressiva e essa qualidade tem a ver com a linguagem visual. Assim como existe a expressividade das palavras, existe a expressividade das formas. Na gravura, o artista preocupa-se tanto com a questão estética como com a questão técnica. De nada adianta você ter ideias expressivas e geniais se não dominar o artesanato que faz parte da gravura. No desenho ou na pintura, por exemplo, a imagem que você imagina vai aparecer no papel exatamente como você a criou (teoricamente, é claro); a gravura é um procedimento indireto, por etapas, e o resultado aparece invertido no papel, você tem que saber como fazer. Deve ser por isso que não há gravadores de fim-de-semana. Somente a dedicação e a persistência podem fazer um bom gravador. O nível e a qualidade artística da gravura repousam solidamente sobre uma base artesanal.
Resta dizer ainda que a gravura é uma arte democrática, a única, aliás, que permite que um original (matriz) possa ser reproduzido muitas vezes e continuar a ser um original, assinado e datado pelo artista, chegando assim a muitas pessoas em muitos lugares, democratizando a arte, tão elitizada em nossos dias, levando-a até mesmo aqueles que não têm condições financeiras de comprar um quadro ou escultura de artistas famosos.
Por tudo isso, faço da gravura minha opção de vida e minha linguagem artística preferida.

“Planta-se um grão colhem-se várias espigas.” Van Gogh.

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